terça-feira, 26 de março de 2013


A BARCA DO DIOGO


Nestes tempos de comemorações do aniversário de emancipação político-administrativa do meu município, Soledade, que segue encrustrada no planalto gaúcho, recordo da minha infância, na década de 1950, onde a “Vila” era o rumo de todas as redondezas, sempre subindo... e de coxilha em coxilha chegava-se ao alto de uma encantadora cidadezinha com suas casas de madeira, baixas e compridas, que bordavam as ruas ainda poeirentas.

Essas paisagens rumo à cidade, enchiam de encantamento minha alma infantil de menina da roça e chegar até a “Vila” era uma aventura sem concorrência. Aliás, ir à cidade a bordo da “Barca do Diogo” era o máximo da aventura!

Chamava-se Barca do Diogo, porque partia, ainda na madrugada, de um local às margens do Rio Jacuí, onde operava uma pequena barca fazendo a passagem de pessoas e veículos de um lado a outro do rio. Era a “Barca do Diogo”.

Feliz e matreira, com minha melhor roupa, acompanhada dos meus pais e irmãos, descíamos ao portão que se abria para o “corredor” e esperávamos com ansiedade a passagem da “Barca”...

Mas era uma barca sem rio... Era uma barca que não navegava! Explicando: tratava-se de um pequeno ônibus, que não consigo definir o ano de fabricação. Talvez da década de 1940, já que nos encontrávamos na década de 1950 e o veículo não era nada novo. De formato arredondado, com um “focinho” meio alongado, pintado de marrom e verde escuro, tinha uma escadinha atrás, que terminava numa cerquinha em seu teto, onde eram acomodadas as bagagens.

A “Barca do Diogo” vinha às nove da manhã, às vezes chegava às dez ou às onze... E como morávamos há poucos quilômetros da cidade, éramos quase os últimos a embarcar... Era esse o termo que usávamos “embarcar”...

O problema é que ela já vinha lotada com os passageiros se apertando ao máximo nos reduzidos lugares (talvez vinte ou trinta) e ocupando todos os espaços disponíveis no corredor e ao lado do motorista. Muitas vezes alguns homens desciam para dar lugar às mulheres e às crianças e subiam pela escadinha misturando-se às malas, trouxas, sacos com milho verde, mandioca, ovos, galinhas e até pequenos leitões. Chegávamos todos vivos, pessoas e animais...

A volta se processava da mesma forma, agora todos carregados de seus sonhos em forma de compras, víveres, tecidos, sapatos... Iam apinhando-se enquanto havia lugares e, muitas vezes, o chiqueirinho das bagagens destinava-se também aos homens com o vento “tapeando-lhes” os chapéus na testa.

Quando chovia, a desgraceira se instalava, molhava os viventes fora e dentro do ônibus. Isso quando não atolava e requeria a ajuda dos passageiros homens ou até de juntas de bois ou parelhas de cavalos...

Mas para o meu mundo infantil e tão restrito, a “Barca do Diogo” era um meio de transporte de luxo e que nos levava aos encantamentos da nossa pequena Soledade.
                                                                   Maria Leda Lóss dos Santos
                                                                                  Soledade, 26 de março de 2013.

sábado, 2 de março de 2013

O CANTO DA FONTE

O CANTO DA FONTE

A fonte que canta alegre,
também pode chorar de dor,
porque o seu constante murmúrio
pode ser um simples sussurro,
ou um gemido de amor.

Seu canto contínuo e doce
traduz o que se tem no peito,
pode ser um acalanto,
ou um suave e triste lamento
por um amor desfeito.

Segue teu canto infinito
de dúvida e de incerteza,
sem confirmar claramente
se cantas alegremente,
ou se teu canto é de tristeza.

Canta, canta enquanto encanta,
oh fonte dos meus amores.
E acalenta meus sonhos
de viver dias risonhos,
Sem pensar nas minhas dores.

Fonte dos meus encantos,
canta, canta sem parar.
Assim sigo nesta vida
Sem ter a ilusão perdida,
de que um dia pararei de cantar.