quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Resenha...


Obra Analfabetismo Cidadania e Desenvolvimento Humano: um estudo na Região da Serra do Botucaraí. Maria Lêda Lóss dos Santos, Juliano Tonezer da Silva (orgs.) Passo Fundo: Ed. Universidade de Passo Fundo, 2010. 170 p.
Esta é uma obra construída a muitas mãos. Resultou dos estudos, reflexões e olhares múltiplos de um grupo de professores pesquisadores e de jovens acadêmicos, tendo como pano de fundo as falas de gestores municipais e de adultos que voltaram para a escola buscando resgatar sua escolaridade perdida. Debruça-se sobre uma questão crucial na sociedade letrada: o analfabetismo.
Além dos organizadores da obra, Profa. Ms. Maria Lêda Lóss dos Santos e Dr. Juliano Tonezer da Silva, participaram os co-autores Dr. Jorge Walter Rivas (Uruguai), Prof. Ms. Nery Auler da Silva, Prof. Esp. Carlos Artur Hauschild, Prof. Ms. Selina Dal Moro, Dra. Solange Maria Longhi, Dr. Adriano Canabarro Teixeira, Ms. Mariane Rocha Silveira, Ms Vitor Malaggi.
Esta obra compõe-se de oito capítulos que tratam do assunto em pauta.
Sobre a obra em geral, tem-se a destacar:
1-    As raízes do trabalho de pesquisa aqui apresentado, plantam-se profundamente nos estudos da Equipe Alfa.analfa, ligada ao GEU/UPF e que investiga a problemática do analfabetismo há aproximadamente trinta anos.

2-    Como integrante desta equipe, tentava-se entender o porquê de ser o município-mãe, Soledade, e a maioria dos municípios daí desmembrados, detentores de altos índices de analfabetismo em relação ao restante do Rio Grande do Sul;

3-    Essas questões desafiaram à proposição do Núcleo de Pesquisa Botucaraí, no Campus Soledade;

4-    Houve a sensibilização de Professores de diferentes áreas, Informática, Direito, História/Arquitetura, Educação e institucionalizamos, em março de 2005, o projeto de pesquisa “Educação e desenvolvimento sócio-econômico-cultural na região da Serra do Botucaraí: um estudo a partir dos índices de analfabetismo e desenvolvimento humano”.

5-    Para chegar-se ao número de municípios a serem pesquisados, adotou-se o cruzamento dos critérios institucional e histórico. Institucional porque seriam pesquisados os municípios que já faziam parte dos estudos da Equipe Alfa.analfa e histórico porque seriam municípios desmembrados do antigo e vasto município de Soledade. Chegamos então ao estudo de 17 municípios.

6-    Em dezembro de 2005, o projeto participou da convocatória do Centro de Cooperación Regional para la Educación de Adultos en América Latina y el Caribe – CREFAL, com sede na Cidade do México. Fomos contemplados e a partir do ano de 2007, passamos a contar com o apoio financeiro dessa instituição, que viabilizou a aquisição de livros, de computadores, as viagens aos diferentes municípios, a remuneração de nossos bolsistas de iniciação científica e a impressão dos exemplares que hoje estamos distribuindo gratuitamente.

7-    Foram feitas várias viagens para a realização de entrevistas. Entrevistou-se um gestor público de cada município, indicado pela Secretaria Municipal de Educação, e 44 sujeitos adultos analfabetos ou em processo de alfabetização.

Os estudos e a análise das entrevistas  levou a conclusões que estão explicitadas ao longo dos artigos e das quais destacamos as seguintes:
1 - Persiste uma forma de silêncio na sociedade letrada: o silêncio do analfabetismo.
2- Segmentos sociais, políticos, econômicos e até educacionais, muitas vezes ignoram as vozes dos não letrados e por isso existem “vozes que não são ouvidas”.  
3 – Há a presença na sociedade brasileira do que denominamos de “triste paradoxo”, ou seja, a existência de analfabetos absolutos, analfabetos funcionais, convivendo em desigualdade em um mesmo espaço da sociedade letrada e altamente tecnológica.
4 – o alfabetismo digital é uma questão que se apresenta e desafia adultos alfabetizados ou não e transcende a questão do alfabetismo das letras, sendo uma demanda urgente e concreta para todas as idades.
5- A restrição financeira dificulta aos municípios darem conta de seus problemas cruciais, como o analfabetismo, a educação, as questões de saúde pública, o desenvolvimento social, entre outros, ficando na dependência de recursos da União e do Estado.
6 – As políticas de Educação de Adultos são descontínuas e desconectadas. A frustração pela descontinuidade atinge sobremaneira os próprios sujeitos analfabetos que se veem frente a novos percalços na sua escolarização, enfrentando novos fracassos. Isto se confirma no tom de tristeza dos entrevistados ao dizerem “[...] fui só três vezes no Mobral...” “...fui no Mova... 
8 - Na sociedade letrada, alfabetização e cidadania são indissociáveis, e ambas, são importantes para a construção de sujeitos autônomos, críticos, criativos e atuantes, capazes de interferir para que se tenha um mundo mais justo e feliz.
Compreender a relação inerente a estes dois conceitos constitui um ponto de debate necessário para a superação do analfabetismo que ainda aflige a MRE Botucaraí.
Finalmente, o desenvolvimento humano, social, econômico, cultural só se dá a partir da qualificação das pessoas e principalmente da educação de todos: homens, mulheres, crianças.
Ao lermos esta obra, damo-nos conta de que só nos tornamos humanos na medida em que olhamos uns para os outros. Com certeza, olhar para a humanidade das pessoas envolvidas nesta pesquisa, torna-nos muito mais humanos.

Maria Lêda Lóss dos Santos
Soledade, março de 2011.